Hoje aprendemos juntos, conectados, através de redes sociais. O intercâmbio é fascinante. Esse fluir contínuo da informação doTwitter ou Facebook é inebriante, porque nos coloca em contato instantâneo com múltiplos mundos, perspectivas, assuntos, pessoas. O perigo está na empolgação da fascinação do ritmo alucinante das mensagens e da falta de concentração e tempo para aprofundar as que são mais significativas. Boa parte do fluir informativo é redundante e banal; não vale a pena dedicar-lhe tanto tempo. Há muito narcisismo, deslumbramento, exibicionismo nas redes sociais, junto com contribuições relevantes, que são pérolas pontuais no meio de um deserto de areia movediça.
Quanta mais informação, mais difícil e complexo se torna o ato de ler e mais necessário se faz aprender a ler de muitas formas, integrando múltiplas linguagens e mídias, de forma muito mais rica e profunda.
Mais quantidade de informação, de telas, de acesso não significa normalmente mais qualidade, mais compreensão, mais aprendizagem. A pressa nos faz, com freqüência, aceitar os primeiros resultados de um site de buscas como os melhores, não os avaliando com cuidado, endossando pontos de vista discutíveis sem questioná-los.
Cada vez mais nos deixamos inundar por múltiplas solicitações informativas, muitas tão sedutoras quanto irrelevantes, que se sobrepõem a temas sérios que precisamos observar com mais cuidado e que correm o risco de fugirem, no meio de múltiplas distrações dos vários ambientes e telas que se sobrepõem continuamente no nosso dia a dia.
É fascinante encontrar sentido no aparente caos, captar a dinâmica dos movimentos, o que é permanente por trás da mutação. Esse é um dos desafios de hoje: conseguir acompanhar as múltiplas interfaces da informação e mergulhar nas suas entrelinhas, nas profundezas dos significados ocultos e escorregadios.
Ler depende, além do domínio técnico, de ter uma atitude curiosa e proativa diante da vida, do mundo, das pessoas. A curiosidade nos motiva a ler, a conhecer, a pesquisar. Ler é um prazer quando queremos saber mais, investigar mais, descobrir ângulos diferentes, indo além do óbvio.
Quanto mais informação disponível, mais complexo se torna o ato de ler. Primeiro, porque precisamos escolher o tempo todo, eliminando a maior parte do que se apresenta à nossa frente. Sempre estaremos acometidos pela dúvida da validade das escolhas feitas: Por que não ler outros textos, outras páginas? Quantas informações relevantes estamos excluindo quando teclamos novos clicks?
Após essa triagem constante, continua a dúvida: o que ler rapidamente, só para um acompanhamento rápido e o que ler com calma, com tempo, com cuidado? Em geral, pela premência do tempo, o que consideramos importante o salvamos, para lê-lo depois com mais atenção. E quando conseguimos retomar de verdade a leitura do que salvamos, se há tantos novos estímulos e materiais que se sobrepõem aos que estávamos mapeando?
É uma arte hoje aprender a mapear rapidamente o tipo de informações que recebemos: as que vale a pena descartar sem ler; as que valem só como curiosidade, entretenimento e que nos ajudam a descansar ou passar o tempo. Há outras informações que nos situam, leituras de referência que apontam para outros textos, outros autores, outros lugares. Há textos que confirmam o que já sabemos e outros que nos surpreendem, porque trazem dados e análises inesperados. Há informações que abrem novas perspectivas em algum campo de interesse e que podem ser extremamente relevantes a médio prazo. Há informações leves, que podemos consumir rapidamente e há outras densas, profundas, complexas, que exigem uma concentração e tempo maiores. Se não nos organizarmos bem, tentamos deixá-las para depois e podemos perder preciosas oportunidades de aprender, de evoluir, de modificar-nos.
Em geral hoje lemos muitas mais coisas, ouvimos e vemos muitas histórias diferentes. É um redemoinho informativo incessante. Mas... aprendemos muito, conhecemos de verdade, compreendemos profundamente o que lemos?
O ritmo frenético de atividades, de exigência de respostas para tudo, de quebra de atenção por chamadas, mensagens, vídeos, solicitações múltiplas dificulta sobremaneira a necessária concentração para a compreensão profunda. Conhecemos muitas coisas, só que mais superficialmente. Como tudo está ao alcance de um click parece que é fácil conhecer. É fácil mapear a informação; difícil é conhecer, compreender os seus múltiplos significados.
Abrir múltiplas janelas nos permite mapear melhor o que está acontecendo. Depois precisamos filtrar, escolher o que focar e o que descartar. O passo seguinte é entender, analisar, refletir, compreender, contextualizar, introjetar, comunicar (dizer ao outro o que compreendemos), aplicar (fazer algum uso do que aprendemos, seja um uso teórico ou prático).
É difícil, mas fundamental, equilibrar o mapear e o focar, visualizar tudo e concentrar-se em tópicos específicos. Organizar tempos de acesso a mensagens diferentes (email, facebook) e tempos de análise de assuntos específicos. Tempos de navegação digital e de navegação “presencial”, de inserção em ambientes físicos. Tempo de estar conectado e de desligar de todos os equipamentos em rede.
No meio dessa voragem informacional é importante manter algumas referências básicas, alguns textos e autores fundamentais e voltar a eles com freqüência. É importante quebrar o ritmo do caleidoscópio informativo para meditar, pensar, analisar, perceber, decantar, concluir. Sem esses tempos de quebra de ritmo, corremos o risco de sermos levados pelas sucessivas ondas, sem saber surfá-las.
Se não equilibrarmos bem o acesso às mensagens e o tempo de estar desconectado, geraremos formas crescentes de ansiedade, de dependência, de dispersão. Produziremos menos e nos angustiaremos mais.
Se não equilibrarmos bem o acesso às mensagens e o tempo de estar desconectado, geraremos formas crescentes de ansiedade, de dependência, de dispersão. Produziremos menos e nos angustiaremos mais.
Com freqüência me perguntam: Como conseguir que os jovens leiam, no meio de tantas distrações nas telas?
Não há uma resposta simples, mas é importante conhecer os interesses dos alunos, o que os motiva e partir do que gostam e dos ambientes que conhecem. Se freqüentam redes sociais, podem ser criadas nelas atividades iniciais de contato, de estímulo para levá-los progressivamente a leituras mais exigentes e em ambientes menos conhecidos. Podem ser utilizados vídeos, histórias em aplicativos digitais como formas de sensibilizar para universos que apontam para outros níveis de leitura mais profundos.
Ensinar a ler, a pesquisar, a compreender num mundo de informações incessantes é um desafio que todos, escola e pais, precisamos enfrentar de uma forma atenta e competente para que nossos alunos e filhos consigam aprender melhor e evoluir cada vez mais.
Texto extraído e revisto do meu livro A educação que desejamos: novos desafios e como chegar lá. 5ª ed., Campinas: Papirus, 2011. Cap.4. Tecnologias no ensino e aprendizagem inovadores
Texto disponível em www.eca.usp.br/prof/moran/caos.pdf
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